14 janeiro 2012

Revista Espírita, março de 1859

Médiuns interesseiros
Revista Espírita, março de 1859


Em nosso artigo sobre os escolhos dos médiuns, colocamos a cupidez entre os defeitos que
podem tomá-los presa de Espíritos imperfeitos. Alguns desenvolvimentos sobre esse assunto
não serão inúteis. É preciso colocar, em primeiro lugar, os médiuns interesseiros, aqueles que
poderiam fazer um ofício de sua faculdade, dando as chamadas a consultas ou sessões
retribuídas. Não os conhecemos, na França pelo menos, mas como tudo pode tornar-se
objeto de exploração, não haveria nada de espantoso em que se quisesse, um dia, explorar
os Espíritos; resta saber como fariam a coisa, se jamais um tal espetáculo tentou se
introduzir. Sem ser completamente iniciado no Espiritismo, compreende-se o que teria de
aviltante; mas quem quer que conheça um pouco quanto é difícil aos bons Espíritos vir
comunicar-se conosco, e quão pouco é preciso para afastá-los, sua repulsa por tudo o que é
de interesse egoístico, não poderá jamais admitir que Espíritos superiores estejam ao
capricho de alguém que os fizessem vir a tanto por hora; o simples bom senso repele
semelhante suposição. Não seria também uma profanação evocar seu pai, sua mãe, seu filho
ou seu amigo por um semelhante meio? Sem dúvida pode-se ter assim comunicações, mas
Deus sabe de que fonte! Os Espíritos levianos, mentirosos, traquinas, zombeteiros e toda a
multidão de Espíritos inferiores, sempre vêm; e estão sempre prontos a responder a tudo;
São Luís nos disse, outro dia, na Sociedade: Evocai um rochedo, ele vos responderá. Aquele
que quer comunicações sérias, deve se edificar, antes de tudo, sobre a natureza da simpatia
do médium com os seres de além-túmulo; ora, aqueles que podem se entregar à atração do
ganho não podem inspirar senão uma medíocre confiança.
Os médiuns interesseiros não são unicamente aqueles que poderiam exigir uma retribuição
fixa; o interesse não se traduz sempre na esperança de um ganho material, mas também
pelas considerações ambiciosas de toda a natureza, sobre as quais podem fundar esperanças
pessoais; está ainda aí um defeito de que sabem aproveitar, muito bem, os Espíritos
zombadores, e os quais aproveitam com um jeito, uma astúcia verdadeiramente notável,
embalando enganosas ilusões naqueles que se colocam, assim, sob sua dependência. Em
resumo, a mediunidade é uma faculdade dada para o bem, e os bons Espíritos se afastam de
quem pretenda fazer dela uma escada para chegar ao que quer que seja, que não responda
aos objetivos da Providência. Ó egoísmo é a praga da sociedade; os bons Espíritos o
combatem, não se pode supor que venham servi-lo. Isso é tão racional que seria inútil insistir
muito sobre esse ponto.
Os médiuns de efeitos físicos não estão na mesma categoria, esses efeitos são produzidos por
Espíritos inferiores, pouco escrupulosos quanto aos sentimentos morais, um médium dessa
categoria, que quisesse explorar sua faculdade, poderia, pois, ter quem se interessasse nisso,
sem muita repugnância; mas aí, ainda, se apresenta um outro inconveniente. O médium de
efeitos físicos, não mais que aquele de comunicações inteligentes, não recebeu sua faculdade
para seu prazer foi-lhe dada com a condição de fazer, dela, um bom uso, e se dela abusa,
pode lhe ser retirada, ou bem voltar-se em seu detrimento, porque, em definitivo, os
Espíritos inferiores estão sob as ordens dos Espíritos superiores. Os Espíritos inferiores
gostam muito de mistificar, mas não gostam de serem mistificados; prestando-se
voluntariamente ao gracejo, às coisas curiosas, não gostam, mais que os outros, de serem
explorados, e provam, a cada instante, que têm sua vontade, que agem quando e como lhes
pareça, o que faz com que o médium de efeitos físicos esteja ainda menos seguro da
regularidade das manifestações, que o médium escrevente. Pretender produzi-las a dias e
horas fixas, seria dar prova da mais profunda ignorância. Que fazer, então, para ganhar seu
dinheiro? Simular os fenômenos; é o que pode ocorrer não somente àqueles que disso fariam
um ofício confessado, mas mesmo às pessoas simples em aparência, e que se limitam a
receberem uma retribuição qualquer dos visitantes. Se o Espírito não dá, será suprido: a
imaginação é fecunda quando se trata de ganhar dinheiro; é uma tese que desenvolveremos
num artigo especial, a fim de colocar em guarda contra a fraude.
De tudo o que precede, concluímos que o desinteresse mais absoluto é a melhor garantia
contra o charlatanismo, porque não há charlatães desinteressados; se não garante sempre a
bondade das comunicações inteligentes, rouba aos maus Espíritos um poderoso meio de ação
que fecha a boca de certos detratores.

Nenhum comentário:

Postar um comentário