10 agosto 2012

O Ferreiro




Era uma vez um ferreiro que, após uma juventude cheia de excessos, resolveu entregar sua alma a Deus.

Durante muitos anos trabalhou com afinco, praticou a caridade, mas, apesar de toda sua dedicação, nada parecia dar certo na sua vida. Muito pelo contrário: seus problemas e dívidas acumulavam-se cada vez mais.

Uma bela tarde, um amigo que o visitara – e que se compadecia de sua situação difícil – comentou:

– É realmente estranho que, justamente depois que você resolveu se tornar um homem temente a Deus, sua vida começou a piorar. Eu não desejo enfraquecer sua fé, mas apesar de toda a sua crença no mundo espiritual, nada tem melhorado.
O ferreiro não respondeu imediatamente. Ele já havia pensado nisso muitas vezes, sem entender o que acontecia em sua vida. Entretanto, como não queria deixar o amigo sem resposta, começou a falar e terminou encontrando a explicação que procurava. Eis o que disse o ferreiro:

– Eu recebo nesta oficina o aço ainda não trabalhado e preciso transformá-lo em espadas. Você sabe como isso é feito? Primeiro eu aqueço a chapa de aço num calor infernal, até que fique vermelha. Em seguida, sem qualquer piedade, eu pego o martelo mais pesado e aplico golpes até que a peça adquira a forma desejada. Logo, ela é mergulhada num balde de água fria e a oficina inteira se enche com o barulho do vapor, enquanto a peça estala e grita por causa da súbita mudança de temperatura. Tenho que repetir esse processo até conseguir a espada perfeita: uma vez não é suficiente.

O ferreiro deu uma longa pausa, acendeu um cigarro e continuou:

– Às vezes, o aço que chega até minhas mãos não consegue agüentar esse tratamento. O calor, as marteladas e a água fria terminam por enchê-lo de rachaduras. E eu sei que jamais se transformará numa boa lâmina de espada. Então, eu simplesmente o coloco no monte de ferro-velho que você viu na entrada de minha ferraria.

Mais uma pausa, e o ferreiro concluiu:

– Sei que Deus está me colocando no fogo das aflições. Tenho aceito as marteladas que a vida me dá e às vezes sinto-me tão frio e insensível como a água que faz sofrer o aço. Mas a única coisa que peço é: meu Deus, não desista, até que eu consiga tomar a forma que o Senhor espera de mim. Tente da maneira que achar melhor, pelo tempo que quiser – mas jamais me coloque no monte de ferro-velho das almas.

Autor: Paulo Daltro de Oliveira.
Livro: A luz dissipa as trevas.
"O Ferreiro" pág. 95/96.

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